Dissertação

A reprodução do Estigma: sobre um (des) conhecido "lugar perigoso" da periferia de Manaus

Esta dissertação se propõe a discutir os processos sociais inseridos nas diferentes etapas de deterioração da imagem de determinado lugar em relação ao seu conjunto. Seu objetivo é compreender como esses processos se dão em uma comunidade do bairro Petrópolis, referida neste texto pelo nome fi...

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Autor principal: Corrêa, Silvia Adriana Lima
Outros Autores: http://lattes.cnpq.br/8540960957459216
Grau: Dissertação
Idioma: por
Publicado em: Universidade Federal do Amazonas 2019
Assuntos:
Acesso em linha: https://tede.ufam.edu.br/handle/tede/7578
Resumo:
Esta dissertação se propõe a discutir os processos sociais inseridos nas diferentes etapas de deterioração da imagem de determinado lugar em relação ao seu conjunto. Seu objetivo é compreender como esses processos se dão em uma comunidade do bairro Petrópolis, referida neste texto pelo nome fictício “Santa Clara”, onde uma localidade de entorno de igarapé foi eleita o “lugar perigoso”. Propõe-se uma análise da construção histórica e social desse “lugar perigoso”, compreendendo-o, antes, tanto como um produto-fim de um amplo projeto societário neoliberal, cujas escolhas político-econômicas permitem a multiplicação de espaços de moradia precária no contexto urbano contemporâneo, quanto como gradação última em uma ordem macro de relações de poder e força, em que se tem a formação de grupos classificáveis, mais ou menos aceitáveis, no mundo social. O Bodozal, nome pelo qual é designado o “lugar perigoso” da comunidade Santa Clara, é um exemplo emblemático de como os simbolismos afetam de forma concreta a produção das realidades, tornando “verdades” informações que sequer requerem prévias reflexões para assim figurarem. A partir de uma análise relacional, observou-se dois grupos que se destacaram em campo antagonicamente: os moradores das ruas da parte alta da comunidade, associados à sua área “boa para morar”; e os moradores dos becos, na baixada, à margem do igarapé, residentes na localidade “degradada” da comunidade. As representações sobre o “lugar perigoso” em questão justificam-se por dois bons motivos. Primeiro, pelas condições materiais de moradia precária e pelo simbolismo imputado à ideia de “favela”, cujo modelo mental reporta às periferias das cidades centrais do país, projeção essa que faz com que a ficção se sobreponha à experiência diária do lugar localizado na periferia de Manaus. Segundo, pela posição dessa localidade no espaço social no contexto da cidade de Manaus, a saber, as margens de um dos igarapés que entrecortam o perímetro urbano da cidade, cujo significado socialmente construído é esmiuçado no decorrer desta dissertação. A confluência de tais condições sustenta, no plano simbólico, um processo de distanciamento e desumanização da imagem do morador desse tipo de localização, esses lidos socialmente e de forma generalizante como “bandidos”, “gente que não presta”, ainda que o cotidiano da localidade não apresente um quadro proporcional à expectativa sobre ela lançada. Ao mesmo tempo produz-se condições reais, cenário e roteiro perfeitos para a reprodução de práticas condenáveis socialmente ou, sendo mais direta, para a reprodução de práticas consideradas criminosas em contexto atual e que se fazem presente na localidade. À medida em que essas condições e julgamentos se reforçam por meio dos processos de comunicação, as ruas da parte alta se valorizam, em oposição à baixada que figura como espaço sem valor. Mas, se o jogo de distinção implica em relações de alteridade para obtenção de um posição privilegiada no mundo social, para os moradores da baixada essa dinâmica pode representar uma boa possibilidade para a fuga da desclassificação social. Então, da mesma forma que são julgados, os moradores da baixada também julgam a partir de critérios estabelecidos entre si, recorrendo aos critérios de diferenciação e reconhecimento em que tentam eleger os mais desclassificados em contexto local. O estigma territorial lançado sobre a localidade e todos seus efeitos concretos apenas se reforçam, paradoxalmente, por meio dos mesmos indivíduos que lhes estão sujeitos.