A urbanização na e da cidade de Manaus tem sido investigada pela Geografia a partir de diversos ângulos e a partir de diversas problemáticas em foco, contudo, de maneira alguma esta temática encontra-se saturada ou esgotada. Há tantos aspectos da urbanização a serem investigados quantos são os movimentos de pessoas, produtos e ideias na cidade ao longo do tempo e do espaço. Assim, consideramos importante abordar as implicações teóricas e práticas de uma perspectiva geográfica humanista, da abordagem cultural e do método fenomenológico-hermenêutico sobre a urbanização da cidade de Manaus. Revendo as perspectivas processuais, organicistas, materialistas e historicistas sob nosso viés encontraremos uma Geografia em ato, um olhar sobre a relação entre humanos e a terra, onde a cultura é o resultado de uma relação que existe como uma forma de cultivo (trabalho) como de culto (narrativas que orientam a vida, a devoção última dos sujeitos). O onde, como e o quando trabalhar, morar e percorrer caminhos passa, então a ser visto como um ato coletivo e simultâneo de construção cultural da cidade, o qual temos chamado aqui de Liturgia Cultural. As liturgias culturais desenvolvem-se junto com a cidade e passam, em determinado ponto, a ser elas mesmas ritos reprodutores da vida urbana. Nossa pesquisa se coloca nessa observação espaço-temporal de Manaus e percebe os ritos surgindo e se colocando em ação. Essa observação nos leva a identificar o calendário litúrgico da cidade, isto é, a representação dos tempos e espaços em que os ritos de construção da cidade são praticados pelos seus muitos sujeitos em atuação. Nossa pesquisa enfoca a cidade de Manaus a partir de três áreas (A Beira, A Moderna e A Metrópole) a partir de um exercício de morfologia e decodificação da paisagem e, a partir disso, se desenvolve como pesquisa de campo, abordando, conversando e compreendendo os sujeitos in lóco. Essa etapa de campo envolveu a aplicação de uma ficha de complemento de frases e a elaboração de mapas mentais (pelos sujeitos). Isso, nos devolve à etapa hermenêutica na qual o mosaico das vivências dos sujeitos com a cidade se junta formando o referido calendário litúrgico. Essa pesquisa demonstrou a existência de ritos litúrgicos distintos entre as áreas da Beira, da Moderna e da Metrópole em Manaus. Os ritos celebram aspectos distintos da vida urbana como (a) suas origens, o que convida os sujeitos a vir e provar da abundância local (Beira), (b) a cidade moderna como o polo industrial e comercial que apresenta uma boa nova de vida e (c) a elevação existencial ao status metropolitano, em comunhão com uma comunidade cultural global. Esses ritos, por sua vez, se estruturam em ciclos espaços-temporais de festejo e de vida “ordinária” que são, de fato o Calendário Litúrgico. Este estudo, por fim, abre caminhos alternativos de compreensão da urbanização em Manaus e dos movimentos culturais que estão em cena se evidenciando ao olhar geográfico. Esperamos que outros ritos e outros arranjos possam ser investigados dando mais cores a esse calendário que representa a vida urbana de Manaus.
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